Caixão com gaveta

Domingo passado na missa, encerrando sua fala e em tom de puxão de orelha, disse o Padre aos fieis que mais pareciam estar num desfile de modas: – Caixão não tem gaveta!

Ele até pediu desculpas pela dureza da expressão, mas é fato que a frase faz muito sentido, além de servir de alerta para quem se preocupa apenas com o consumo. Me incluo nesse meio, pois dou um significado ao dinheiro e às coisas materiais muito maior do que deveria.

Não vou e nem quero discutir a profundidade dessa frase, mas ela me deu uma boa ideia e por isso mencionei. Quero raciocinar de forma contrária a do Padre.

Digamos que os caixões tivessem gavetas, o que você colocaria dentro delas? Pois é, fiquei um bom tempo pensando nisso. O que será que eu levaria comigo quando fosse embora daqui? Além dessas coisas, digamos que a gaveta tivesse um espaço para levar realizações ou lembranças. Claro, ninguém aqui está pensando em morrer tão cedo, portanto vale também brincar com a imaginação e tentar pensar no que ainda falta realizar e, portanto, algo que valha à pena ser levado para o além.

Pois é, acho que vale fazer esse exercício de pensamentos, memória e imaginação. O que será que eu levaria… afinal de contas, uma gaveta de caixão não deve caber muita coisa.

Aí é que o bicho pega. Levar poucas e significativas coisas. Toda escolha envolve uma renúncia, então dói muito escolher um ou outro momento, uma ou outra coisa. Eu adoro dificultar a vida, não no sentido de arrumar problemas onde não existem, mas dificultar no sentido de aprofundar pensamentos. Acho que esse texto é um exemplo clássico disso.

Assim sendo, vamos limitar e dificultar tudo isso. Vale levar 3 coisas materiais, 3 lembranças e 3 realizações… sendo justo, por que não colocar na gaveta mais 3 sonhos, ou seja, algo que ainda não foi feito e que precisa ser realizado antes da hora que ninguém quer que chegue, chegar. Obviamente não vale pensar em 3 pessoas, seria uma sacanagem sem tamanho, né?

Deixem-me pensar num ponto importante. Acredito que exista algo do outro lado, ou melhor, espero que haja. Mesmo assim, não consigo imaginar como deve ser e… bem, não sabendo nada sobre isso creio que não deveria fazer minhas escolhas baseadas no conceito: O que será que é importante lá no além.

Toda essa limitação me remete então a pensar no que foi importante aqui. Não só no que foi como no que é e no que ainda vai ser. Essa brincadeira está ficando complicada. Pensar nisso no meio dessa madrugada fria onde eu deveria estar deitado e dormindo pode causar sérios danos. Nem que sejam danos ao meu necessário sono. Mas vamos em frente, já enrolei muito.

Três coisas… Como é difícil. Sou super possessivo, consumista e adoro tudo o que tenho, mesmo sendo um cara que volta e meia limpa os armários e separa muita coisa para doação. Ai, ai, ai. O que colocar nessa gaveta? Um par de tênis? Um relógio? O Iphone? Cigarros? Um dos meus isqueiros Zippo? Ah claro, não posso deixar de levar minha TV. Se bem que no céu não deve ter NET então não valeria à pena… pronto, olha eu quebrando minha própria regra e pensando no que seria útil… além de pretensioso, nem sei se vou para o céu, mas esperança é a última que morre. Será que depois da própria morte esse ditado ainda vale?

Ok, coisas que gosto e ponto final: Tênis, relógio e… e… meu Iphone. Mesmo que não vá fazer nenhuma ligação, posso pelo menos Twittar. Agora três lembranças. Nossa, complicou de vez. Deixa eu pensar direitinho. Teve aquela vez que… não essa não. Mas foi tão marcante… Bom, marcante foi, entretanto não a ponto de levar para a eternidade. Ou será que sim? Deixa pra lá, lembrar disso me deixou triste.

Claro, essa aqui vale: A viagem para a Disney com o meu filho. Sim, essa vale, foi incrível. Se bem que o nascimento dele também foi uma experiência inesquecível. Pai coruja é assim mesmo, dêem um desconto, mas fico com a viagem. O nascimento foi mais importante, emocionante, mas a viagem foi mais divertida.

Ainda faltam duas. Dificultei tanto que agora sinto que serei injusto com minhas próprias escolhas. Ah esse nosso Ego-Sistema, é só um exercício, uma brincadeira e já estou me sentido culpado sei lá por que se nem escolhi ainda. Vale pular essa parte? Vale sim, o Blog é meu.

Agora as três realizações. Não fiz nada de significativo para o mundo, mas fiz muitas coisas que marcaram profundamente minha vida. Escolher três é que são elas. Meu primeiro livro, sim evidente, foi uma coisa que eu desejei muito. Outra coisa, sem citar nomes, ter colaborado na recuperação de certa pessoa que estava, literalmente, abandonando a si mesma. É, sem dúvida alguma essa não pode ficar de fora. Vou deixar em branco esse último espaço… todas as coisas que pensei são bem parecidas em termos de “pontuação”, melhor não escolher para depois me arrepender.

Continuando, três sonhos… isso é desumano, fazer esse exercício e levá-lo a sério é maldade. Tenho muito mais do que três coisas que quero fazer. Porém, só poderia levar três comigo… Então, uma deles é lançar um livro que estou escrevendo e que é um grande desafio para mim, Ego-Sistêmico Master Plus: Escrever na terceira pessoa e não na primeira como faço. Não levaria comigo o livro e sim o conceito da superação, conceito de “vencer um desafio”.

Os outros dois não sei ainda, mas provavelmente a lembrança de uma viagem que ainda não foi feita e também, por que não… ah, esquece. Não quero mais falar disso.

MM

7 respostas em “Caixão com gaveta

  1. …só se leva o que se vive, o que se conhece!!!
    na minha opinião.
    Adoro seus textos!!!!
    Abraço

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  2. Difícil decidir apenas 3 coisas. Talvez as realizações sejam mais fáceis. Agora, qto aos sonhos, na minha opinião, se levá-los para o lado de lá seria levar 3 frustrações, não? Afinal, como eu os realizaria?

    Juro, vc criou um nó na minha caixola… hahaha….

    Adorei a pelêmica!

    Bjos

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  3. Hoje, infelizmente as pessoas se preocupam mais em “ter” do que “ser”. Cruel realidade!!!!Sinceramente, mas na gaveta do meu caixão, na questão material levaria meu isqueiro e meu cigarrinho free azul, meus eternos companheiros nas minhas horas de solidão. Uma lembrança boa e inesquecível seria do meu pai me ensinando a nadar. Bons tempos!!!E no meu sonho…hahahahah…um dia direi pra pessoa certa na hora certa!!!!Por enquanto é segredo!!!!!

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  4. Adoreiiii.
    Eu fiz o exercício. Foi divertido e difícil ao mesmo tempo. Geralmente mulheres não são práticas e sempre excedem na bagagem. Perdemos horas, dias, semanas, arrumando e planejando as malas, pra passar alguns dias fora…rs. Até que eu me saí bem. Em doze horas, contando com as cinco de sono, decidi o que levar nas gavetinhas do caixão…rs. Foi muito interessante…muito mesmo.
    Estou me sentindo até mais ” leve ” depois desse exercício.
    Beijo

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  5. Difícil, ou melhor, além de impossivel, não faz o menor sentido interagir com quem não se identifica…
    Sorry…

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  6. Estou curiosa para saber sobre as outras 2 lembranças….e seu último (terceiro) sonho!!!!

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